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Sinfonia urbana

As dificuldades daqueles que vivem como artistas de rua na capital

Foto: Guilherme Pin

Caminhar na estação Trianon-Masp, na avenida Paulista, é possível escutar Jhoão Sobral, músico e produtor de 35 anos, tocando sua vassoura. Com seu instrumento, uma corda e uma caixa de som, o músico consegue fazer a apressada população parar por alguns segundos e apreciar sua arte. “Impressionante, né? ”, reage um senhor deixando R$ 5 na caixinha do artista. Jhoão é só mais um entre os mais de 100 artistas que dividem o mesmo palco, a cidade de São Paulo. “Tocar na rua te possibilita entrar em contato direto com o público”, explica o músico que veio do Ceará.


Segundo a pesquisa da São Paulo Turismo, por meio do Instituto de Pesquisa, Estudos e Capacitação em Turismo – IPET, realizada em 2011, 33% dos artistas de rua estão nessas condições por ser uma oportunidade de fonte de renda através de uma paixão, a música, e dentre os dados, 36% dos artistas estão entre seus 21 e 30 anos, como é o caso do músico Nicolas Garcia Andrade, de 24, que enxergou na rua uma possibilidade de fazer o que gosta, tocar. Originado de São Bernardo do Campo, no ABC, Nicolas toca em São Paulo devido as variadas opções de lugares. “Gosto de estar cada dia em um lugar da cidade. Para mim não faz sentido tocar na rua e ficar sempre no mesmo lugar (...) Comecei sem me preocupar com o que as pessoas estavam pensando ou a quantia de dinheiro que eu conseguiria”, explica.


Com a cantora, compositora, arranjadora, professora de música, produtora e técnica de áudio, Olivia Genesi, 46 anos, foi um pouco diferente. Com o projeto “Olivia e as músicas na rua da cidade”, a professora foi às ruas com a intenção de registrar sua experiência em vídeo e publicar, querendo que as pessoas conhecessem seu trabalho já estabelecido de 10 discos e um DVD. “Meu objetivo era ver a reação, quis saber como ia soar na rua”, explica Olivia, que usava um banquinho e um violão para tocar em saídas de metrô e terminais de ônibus.


Dividindo a paixão pelo rap, que vem desde os 18 anos, Jorge Luís Brandão de Moraes, de 44 anos, também conhecido como “Fator do Eg”, não vive da música e para isso precisa conciliar com outro trabalho. “É difícil pra caramba, tanto que eu assumo a profissão de tatuador. Faço tatuagem para poder fazer música”, conta o rapper, que está entre os 62% dos artistas que divide a arte com outra ocupação. Outros dados apresentam que em São Paulo a música é a expressão artística mais utilizada pelos artistas de rua, com 61% em relação a outras expressões, como estátua viva, malabarismos e desenhos. Jorge coloca em discussão ao achar o conceito de arte relativo e que muitos não enxergam como cultura. “Dependendo do que você está fazendo, as pessoas não enxergam como arte (...) tem gente que não dá valor”, explica. É o que Nicolas também conta. “Para algumas pessoas, arte de rua é a mesma coisa que estar mendigando”, e lembra de quando já ouviu pessoas o mandando ir trabalhar enquanto se apresentava. Olivia também passou por situações parecidas, com porteiros e zeladores tentando expulsa-la do espaço público em que tocava.


E mesmo dentro das estações de metrô, os músicos já sofreram restrições, como conta o arte-educador e músico, Magno Wladimir Camilo, de 42 anos, “teve uma vez na estação República que os seguranças chegaram meio sem jeito para falar comigo, me disseram ‘olha, a música está ótima, porém você precisa se retirar’”. A compositora e música Lucia Zorzi Bueno, de 31 anos, que desde 2014 toca nas ruas da Paulista, nunca enxergou como um preconceito da parte do público, mas sim, uma falta de entendimento.


E não é só de brasileiro que vive as expressões artísticas das ruas de São Paulo. Segundo a mesma pesquisa, 18% dos artistas de rua são estrangeiros. “Quando fui tocar em Paraty conheci um uruguaio que tocava saxofone (...) tocamos por algumas horas na frente do festival da cachaça que estava rolando por lá. Foi uma experiência bem legal”, conta o musico do ABC. Estrangeiro ou não, a maioria dos artistas continua sendo da própria cidade paulista, onde apenas 26% vem de fora, mas de acordo com Olivia, ser de São Paulo não traz muita vantagem, pois não consegue tanto espaço devido a diversidade.


Vindo de fora ou não, sobreviver em São Paulo não é algo fácil, principalmente quando se vive da própria arte. “Não vivo 100% de música, mas se eu vivesse seria uma batalha muito, sei lá, tipo um filme de aventura”, conta Lucia, afirmando que São Paulo continua sendo um dos melhores lugares para se fazer isso. O que hoje possibilita a apresentação desses artistas na rua vem de maio de 2012, mês e ano da aprovação do projeto que estabelece regras para apresentações de Artistas de Rua, mas, mesmo com o cumprimento da lei, os artistas sentem que ainda precisa de muito apoio. “As pessoas precisam compreender que a arte de rua é um trabalho sério e que boa parte dos artistas, estão ali porque querem. É pelo o amor à arte e a liberdade de se expressar”, defende Nicolas.


“Para uma cidade tão caótica, tem que ter a parte boa do caos (...) Acho que é parte da minha missão, tocar as pessoas nesse ponto sensível, na galera que está muito fria no caos de São Paulo”, explica Lucia. “Tem pessoas que não tem tempo ou dinheiro para ir a shows, cinema, teatro ou ler um livrinho de poesia e etc (...) A pessoa só precisa parar e curtir o que o artista está fazendo”, diz Nicolas, demonstrando-se apaixonado pelo o que faz.


Em meio a todas as dificuldades, fazer de São Paulo um lugar melhor é um pedacinho da missão de cada artista, esteja ele ali pelo dinheiro ou pela paixão de fazer arte, no caso aqui, música. “Me senti na obrigação de fazer alguma coisa e tentar ajudar de alguma maneira. Daí nasceu a ideia de se fazer apresentações em lugares públicos, para poder levar a música para as pessoas”, explica Magno sobre sua ida às ruas, fortalecendo o pensamento de Gandhi levado pelos artistas afora: “Temos que nos tornar a mudança que queremos no mundo”.


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