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Carimbo Cultural

Histórias e contrastes dos imigrantes ao chegar na cidade


Pouco a pouco as roupas saíram do armário; calça, casaco e todos os tipos de blusa enchiam a cada dia aquelas malas. Diferentes países e motivos, mas um único destino, Brasil e o desafio eminente de sobreviver em São Paulo.


Em 16 de agosto de 2008, César Augusto Aranguibel Molano, venezuelano chega na megalópole. Juntos de seu pai e mãe, a família se aloca no bairro de Alphaville e a imigração se deu por um único motivo, o pai do jovem havia sido transferido para o país, uma vez que a empresa a qual trabalhava estava enfrentando problemas sociais, econômicos e jurídicos no país de origem. Anna Luciana Gueraldo, meados de 1947, com apenas oito anos a menina chega a cidade acompanhada de sua irmã mais velha, fugindo da segunda guerra mundial na promessa de uma vida prospera e algumas horas de sono sem ameaça constante de bombardeio na Itália. Aos doze anos de idade, Sara Vazquez Pereira, chegou na cidade acompanhada dos pais, também com a promessa de uma vida melhor diante o pós guerra que a Espanha enfrentava.


Diferentemente da grande maioria de imigrantes que chegam em São Paulo, as três histórias tiverem um desenvolvimento feliz, independente do motivo de abandono do país de origem e conseguiram se estabelecer na Cidade, mesmo assim as dificuldades e desafios continuam a assombrar parte dos dias de cada um.


César Augusto, hoje com 23 anos é estudante de música na Faculdade Souza Lima, apesar de hoje estar estabelecido e acostumado com o a grandiosidade de tudo na cidade, sua chegada foi traumática “A minha maior dificuldade não foi tanto o idioma, a língua, foi mais o tamanho. Lá na Venezuela eu morava em um cidade pequena, mais importante, eu estudava em uma escola pequena, conhecia todo mundo” relembra o jovem que chegou em um sábado na capital e logo na segunda - feira já retomou os estudos no Colégio Mackenzie, o qual abrigava mais de 1.500 alunos. Sara hoje com 77 anos, já estabelecida e com família formada, reconhece que diferente de César e assim como Anna, que sua maior dificuldade foi o idioma.


Com um destino a princípio menos incerto do que o jovem, que já chegou com uma estabilidade no país representada pelo trabalho do pai, Anna e Sara encontraram segurança após o casamento, no entanto, diferentemente de Sara que é dona de casa, Anna abriu seu próprio negócio, uma academia de Ballet para sua filha mais velha trabalhar. Anteriormente a isso viveu de alguns trabalhos pouco remunerados e reconhecidos, como logista e até mesmo a venda de cachorros resgatados na rua, posteriormente trabalhou em um jornal sendo responsável pela parte comercial do mesmo. Muitas das dificuldades que enfrentou foi resultado da perda do marido aos 37 anos de idade. No final do ano de 2016, Anna fechou a academia que havia se tornado a mais reconhecida de Cotia, Granja Vianna especificamente e abriu um novo negócio com seus três filhos, uma loja de doces no bairro do Itaim Bibi.


Por sempre ter desenvolvido seu próprio trabalho e comércio, Anna nunca enfrentou dificuldades efetivas com o mercado “Na época em que eu cheguei em São Paulo, muitos outros imigrantes chegaram em situações semelhantes e/ou iguais a minha e por isso o preconceito foi diluído pelo menos no que diz respeito a minha geração” aliviada com a situação Anna ainda comenta que é muito fácil encontrar imigrantes com histórias parecidas com a dela, como o caso de Sara, fator que torna a vinda para o país mais fácil e aconchegante.


“Sempre fui muito bem acolhido pelos paulistanos, o brasileiro é um povo muito carinhoso o que sempre ajudou muito na minha estadia, bem-estar, nunca senti nenhum tipo de preconceito em relação a nacionalidade, sotaque ou costumes”, apreensivo o jovem repensa e aos poucos conclui que apesar de não se sentir excluído socialmente, hoje como músico enfrenta um certo receio ao ser contratado para tocar músicas brasileiras “como assim um venezuelano tocando músicas brasileiras de raiz”.


Com a vida ainda em construção e a incerteza de um futuro, como todo jovem, César sente falta da pequena cidadezinha da Venezuela, entretanto, a situação econômica, que apresenta a maior taxa de inflação da história do país, a segurança social que por sua vez apresenta o índice de mortalidade por criminalidade tão alta quanto a guerra do Iraque e Afeganistão e a situação social como um todo mantem em São Paulo, entristecido ele comenta “[...] as vontades são imensas de voltar, mas não é uma situação que eu queira estar”.


“Eu tenho uma família desenvolvida aqui, filhos, netos e uma vida economicamente estabelecida, eu sinto falta, mas não largaria o que construí aqui para voltar para a Espanha”, contudo Sara planeja voltar para visitar apenas como turismo, assim como Anna que saudosamente retornou a sua cidade e passeou por todas as ruas que costumava andar quando pequena.


Os três dizem que São Paulo tem tudo a oferecer e que depois de quase 10 anos aqui são poucas as coisas que sentem falta, César ressalta entristecido as amizades, hábitos culturais e principalmente a família que era muito unida e estava sempre junta. Anna e Sara por saírem ainda muito crianças do país de origem e parte do período que viveram lá ter sido conturbado e com ameaça constante da guerra, afirmam que é mais difícil sentir falta.


Desde o motivo que os trouxeram para o país, a forma como vieram e como foram forçados a se desenvolveram em São Paulo, hoje os três imigrantes dizem se sentir parcialmente paulistanos e gostam muito da cidade, mas reconhecem também que a famosa SP é uma cidade cheia de oportunidades e riscos que os imigrantes tem que sempre estar atentos e aprenderem a viver. “É importante fazer da sua realidade e vida aqui, São Paulo tem muito o que te oferecer e se você não está se sentindo bem ainda é porque não se encontrou, não achou seu nixo/grupo na megalópole”, com o brilho nos olhos César continua dizendo que a cidade é cheia de contrastes e isso faz dela maravilhosa. “Você precisa aceitar o tamanho de São Paulo e não se deixar ser engolida por ela, porque apesar de contrastante é muito fácil se perder em meio a tanta informação” insiste Anna.


Sara ressalva insistentemente que para sobreviver em meio ao caos da cidade é preciso conseguir se colocar no mercado de trabalho de alguma forma, “só assim você tem grandes chances de conquistar uma qualidade de vida e por isso os refugiados estão em situações precárias de vida”.


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